1 - O Multi-club ownership é visto pela maioria dos especialistas como o futuro. Na sua ótica, A partir de que momento na história do futebol é que tal aconteceu? Existiu algum ponto de viragem fundamental para esta nova realidade?
R: O multi-club ownership, em que um único indivíduo ou empresa possui ou gere vários clubes de futebol, tem vindo a ganhar popularidade nos últimos anos, mais especificamente no final dos anos 2000/início dos anos 2010, quando o City Football Group (CFG) e a Red Bull entraram no mercado do futebol a nível mundial. Esta tendência pode ser explicada, em parte, pela crescente globalização da modalidade, bem como pelo crescente poder financeiro de certos indivíduos, empresas e países. Nos últimos anos, vários investidores com elevado património financeiro tentaram reproduzir o modelo do CFG e da Red Bull, tirando partido das economias de escala de vários clubes e das oportunidades de simplificar o processo de formação de jogadores. Prevejo que esta tendência continue a crescer no futuro, uma vez que os investidores vão à procura do talento jovem em novos mercados.
2 - Quais os principais pontos a considerar previamente à escolha de um clube para investir?
R: Para mim, os fatores mais importantes que me levam a investir num clube de futebol são:
- Infraestruturas (Estádio, Centros de Formação, Academia)
- História / Adeptos
- Localização Geográfica
- Solidez Financeira (Dívida, Lucro, Ativos)
- Performance desportiva (O clube encontra-se em risco de despromoção? Ou perto da promoção?)
3 - A sua entrada no futebol europeu deu-se em clubes localizados no norte da europa, precisamente em Inglaterra, irlanda e Dinamarca. Pode explicar-nos o porquê da aposta nestes mercados?
R: De um modo geral, penso que muitos mercados do futebol europeu estão demasiado saturados com investidores que tentam fazer o mesmo que todos os outros estão a fazer. A minha abordagem é mais disruptiva, em que tento encontrar oportunidades de negócio e mercados onde não exista tanta procura. Gosto particularmente dos mercados do norte da Europa, que considero subvalorizados no que toca à formação de jogadores. Além disso, muitos dos clubes do norte da Europa são geridos de forma mais sustentável do que os clubes que vi no sul ou no leste da Europa. Olhando para o futuro, creio que existem oportunidades em mercados em desenvolvimento como a América Latina e a Ásia, locais onde, de forma geral, tem havido pouco investimento externo. Para além da região geográfica em específico, penso que é importante mostrar uma prova de conceito em termos de compra e bom funcionamento dos clubes. Vários dos meus projetos ligados ao futebol foram muito específicos e estrategicamente orientados para me ajudar a adquirir a experiência necessária para então gerir alguns dos maiores clubes da Europa no futuro.
4 - Em Portugal, já existem alguns clubes incluídos nesse sistema de multi-club ownership. Como olha para o caso português? É, atualmente, um mercado favorável para os investidores?
R: É evidente que o mercado português é bastante atrativo para o investimento estrangeiro devido ao forte historial de clubes que desenvolvem e vendem jogadores. Uma vez que a maioria dos modelos de multi-club ownership depende fortemente da venda de jogadores, faz sentido que Portugal se torne num mercado atrativo para a aquisição de clubes. O que me preocupa nesta altura é o facto de o interesse pelo futebol português ter inflacionado o valor de compra dos clubes, mesmo em divisões secundárias. Muitas vezes, os clubes destas divisões não dispõem do tipo de estádios e infraestruturas capazes para o desenvolvimento de jogadores que um modelo de MCO exige. No entanto, Portugal continuará a ser um mercado apetecível para este tipo de investimento, especialmente tendo em conta a futura centralização dos direitos audiovisuais.
5 - Sente que a futura centralização dos direitos audiovisuais em Portugal tornará o país mais atrativo para os investidores?
R: A passagem para um modelo centralizado dos direitos audiovisuais em Portugal é um fator de transição que levará ao crescimento e surgimento de novas oportunidades para o futebol português. O atual acordo sobre os direitos audiovisuais faz com que uma parte significativa das receitas seja atribuída aos maiores clubes, o que torna difícil a elaboração de um modelo financeiro viável para qualquer outro clube. Do meu ponto de vista, esta nova estrutura permitirá aumentar significativamente as receitas dos clubes mais pequenos, dando-lhes mais oportunidades de competir por lugares europeus e de construir modelos financeiros sustentáveis. Pelas conversas que tive com investidores estrangeiros, já existe um interesse significativo no futebol português devido às futuras alterações nos direitos audiovisuais.
6 – Enquanto americano, está ciente das diferenças notórias que existe na maneira como o desporto funciona na sua terra natal em comparação com a Europa. Diria que na europa é mais complicado implementar com sucesso este tipo de projetos de investimento ou isso faz parte do passado?
R: Nos últimos cinco anos, a minha vida foi passada entre os Estados Unidos e a Europa, por isso adquiri uma visão única do mundo do desporto em ambos os lados do Atlântico. De um modo geral, o modelo financeiro do desporto na América do Norte é orientado para o entretenimento e obtenção de lucro, ao passo que, na Europa, o modelo é centrado na paixão e nos adeptos. Posto isto, o desporto na Europa tem vindo a evoluir (lentamente) para uma estrutura mais sofisticada, com pessoas que procuram obter um retorno favorável dos seus investimentos. Pode ser muito difícil ter uma abordagem centrada na obtenção de lucros na Europa, visto que existe o risco de despromoção, uma falta de controlos salariais ou de tetos salariais e pouco rigor financeiro na maioria dos clubes. No entanto, estou firmemente convencido de que os clubes na Europa precisam de ser geridos de forma sustentável, através de uma gestão financeira sólida. Deve haver um equilíbrio entre a necessidade de retorno financeiro num clube de futebol, mas também um forte entendimento da importância da massa adepta destes clubes. Embora seja difícil, este equilíbrio é uma dos pontos principais de sucesso no futebol europeu e é algo que procuro alcançar em todos os meus projetos.
7 - Numa entrevista recente, mencionou que a Comunicação é um dos fatores mais relevantes na boa gestão de vários clubes em diferentes países. Tendo em conta a sua experiência, quais os segredos para uma boa comunicação nesse contexto?
R: A comunicação é a chave para uma boa liderança em qualquer organização e, num clube de futebol, é ainda mais importante em virtude da forma como estes clubes estão preparados para o futuro. Acredito numa filosofia de transparência e integridade para com o staff, adeptos e patrocinadores, promovendo, assim, uma cultura e um ambiente em que as pessoas se sentem devidamente informadas e ligadas ao clube. Não tenho dúvidas de que, quando tomei decisões como sócio-gerente do FC Helsingør, as pessoas nem sempre concordaram, mas, de um modo geral, senti que havia respeito pelo facto de eu ter sido sincero e transparente sobre as razões e a forma como tomei essas decisões. Muitos destes proprietários tendem a ser omissos neste sentido, o que não é propriamente um modelo de liderança viável num clube de futebol.
8 - Enquanto investidor, o Jordan tem optado por manter-se no futebol. Qual a sua opinião em relação a manter investimentos em mais do que um desporto?
R: Há muitos investidores que acreditam na diversificação quando se trata de investir no mercado desportivo. Isso faz todo o sentido, e há exemplos como os San Francisco 49ers, que são proprietários de um franchise da NFL e estão igualmente envolvidos na gestão do Leeds United da Premier League inglesa. Penso que a experiência obtida em vários desportos pode ser bem aproveitada, sendo evidente que que existem sinergias claras no que toca ao investimento multi-desportivo. Posto isto, o futebol, em particular, tem uma estrutura única e algumas pessoas podem subestimar a inclusão de clubes de futebol no seu portfólio multi-desportivo. No entanto, de um modo geral, penso que a diversificação é uma estratégia de investimento inteligente.
9 - Tem sido uma presença assídua em eventos que promovem o debate e o networking entre os grandes players da indústria, tal como o Thinking Football Summit, onde estará presente pela primeira vez em 2023. Para um investidor sempre atento a novas oportunidades, qual a importância de participar neste género de eventos?
R: É sempre um gosto falar em vários eventos e conferências sobre futebol por todo o mundo. Na verdade, acabei de chegar da Cidade do México, onde falei numa conferência sobre as tendências crescentes em matéria de investimento e análise de dados no futebol da América Latina. Não há nada que substitua a troca de ideias direta e considero particularmente importante participar nestes eventos para conhecer as especificidades de cada mercado. Este será o meu primeiro ano como orador no Thinking Football Summit e estou ansioso por estabelecer relações e aprender mais sobre o excitante futuro do futebol português.
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